Luana Schrader
Achava piegas quem declarava “fazer amor”, até me deparar com o abismo entre “transar” e “fazer amor”.
Verbos e adjetivos distintos, orações sagradas, um vocabulário rico e entremeado por sinônimos singulares típicos dos enamorados.
Quem transa entrelaça corpos. Quem ama, funde corpos, almas e corações.
Piegas era debochar de quem amava com pele e alma, brega era encontrar quem só transava com o corpo e deixava o coração do lado de fora da porta trancafiada. Deselegante eu diria.
Dia desses, através da minha janela, vi um casal que se amava. Alheios ao mundo, corpos nus entrelaçados, respirações entrecortadas e olhos nos olhos.
Os corpos orquestravam sinfonia sincronizada, como se dançassem ao som de suas respirações e batimentos. As mãos exploravam e emolduravam a pele, dedilhavam e arrepiavam, apertavam e afrouxavam, marcavam e acariciavam. Uma dança hipnotizante, uma pintura sensual e uma canção envolvente.
Artistas. Eu via dois artistas mergulhados na magia do verbo mais belo: AMAR. Assim mesmo, em caps lock.
Do alto do décimo sexto andar, eu via amor e desejo, calmaria e tesão. Luxúria andava de mãos dadas com o exibicionismo de uma noite de amor de frente para as janelas do chão ao teto. Eles não ligavam para o mundo externo, só queriam a canção que seus corpos compunham com tanto ardor.
Naquela noite percebi que ardor rimava com amor. Assim como seus corpos sincronizados. Em 42 metros quadrados ecoava a melodia de notas açucaradas e apimentadas. O sexo como obra de arte, os artistas como inspiração e o cenário como cúmplice de um crime perfeito.
Eu os assistia. Nos assistia. Éramos os artistas encenando o quarto ato do nosso espetáculo teatral.
Sorri para nosso reflexo nas janelas e puxei as cortinas. Fim do nosso show sur(realista).